Enquanto um mar vermelho de venezuelanos lamenta a morte do presidente Hugo Chávez, a mídia internacional fica atenta ao possível novo cenário político da Venezuela. Para entender o cenário político e social da comunidade LGBT no país, o Mix entrevistou o professor Carlos Colina, da Universidade Central da Venezuela, que tem como linha de pesquisa “Comunicação, Gênero e Diversidade Sexual”. Na entrevista que segue, ele analisa o governo chavista sob a ótica dos direitos LGBT.
A ILGA (Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersexo) publicou um estudo sobre a Venezuela. A pesquisa foi realizada por grupos LGBT que atuam em parceria com a Associação para identificar questões que afetam a comunidade LGBTI. No questionário, é informado que existe uma lei que proíbe a discriminação por orientação sexual válida na Venezuela. Como essa lei funciona?
Na verdade, não há nenhuma lei específica contra a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero. Apesar da existência de grupos LGBT de ativismo lutando para os direitos iguais entrarem em pauta na política, não há nenhuma lei específica contra a discriminação com base na orientação sexual e identidade de gênero, não foram aprovadas a união homossexual ou o casamento civil igualitário, não há uma lei de identidade de gênero que proteja transexuais, e tampouco uma lei contra crimes de ódio de verdade.
O presidente Hugo Chávez teve uma visão negativa dos homossexuais?
Eu acho que o principal a se observar é que não há políticas igualitárias em relação aos homossexuais. Não existe um conjunto de atividades legislativas e sociais voltadas constantemente para um determinado setor ou grupo de sociedade, neste caso para a comunidade LGBT.
Conversando com um brasileiro gay que viveu por um ano em Caracas, ele me disse que não se discute muito sobre a comunidade LGBT na Venezuela. Ele também afirmou que não sentia segurança ao caminhar na rua com o namorado, porque as pessoas olhavam para ele e ele ouvia zombarias com base na sua orientação sexual. Como é a vida da comunidade LGBT em Caracas?
É certo que não é comum para os gays, lésbicas, transexuais e transgêneros expressarem seu afeto em público sem serem provocados, sofrerem assédio verbal e até mesmo violência física. Recentemente, começamos a procurar uma rua da cidade para que estas expressões de intolerância sejam restritas pelo grande acúmulo de LGBT, mas é um espaço muito pequeno da cidade. Ainda assim, a atmosfera gay como bares, clubes e saunas não é como em outras cidades do mundo, com identificações externas (anúncios, cartazes, bandeiras) de diversidade sexual. Homossexuais sempre estão expostos a crimes de ódio, que raramente são cobertos pela imprensa.
Com a morte de Hugo Chávez, você acredita que a comunidade LGBT terá espaço na política da Venezuela?
Eu acho que tudo depende das pressões das ONGs, da força jurídica e da onda de abertura internacional aos direitos humanos, juntamente com os gays ativistas, pois toda a classe política venezuelana, independente de sua orientação político-ideológica, é sexista e homofóbica. Não existe um político venezuelano fora do armário. E ninguém se atreve a defender, de forma inequívoca, as bandeiras da diversidade sem o medo de ser considerado gay em outros contextos. O setor político venezuelano não dá importância ao Estado laico, como a realização inegociável da modernidade e que, em outros contextos, tem permitido o progresso que alcançou internacionalmente o movimento LGBTI. O setor está muito perto da oposição da Igreja Católica. O setor de governo bolivariano inclui deputados e elementos evangélicos e cristãos misturados no mesmo discurso.
Quais são os direitos que os homossexuais têm na Venezuela?
No processo 190, artigo 2 º, de 2008, o Supremo Tribunal Federal afirma que “é possível, dentro do quadro constitucional venezuelano, o indivíduo não deve ser discriminado por causa de sua orientação sexual”. Além disso, há o direito de não ser discriminado no local de trabalho, no acesso aos serviços bancários e de tratamento não discriminatório por parte da polícia. E o direito à proteção das vítimas de discriminação com base na orientação sexual e identidade de gênero também proíbe anúncios de aluguel de habitação que expressa um critério discriminatório. No entanto, em muitos casos, esses direitos são letra morta. É importante que a concessão de um direito não esteja ligada ao pedágio ideológico, que atente contra as liberdades fundamentais. Nas saunas gays, encontra-se uma situação inédita com advertências contra a discriminação racial, uma lei específica, se ela houver.
Qual é a próxima batalha da comunidade LGBT na Venezuela?
Na minha opinião, eles deveriam lutar por políticas públicas para o setor, que inclui ir além do Legislativo. A nível nacional e internacional, a comunidade LGBT deve lutar por direitos sexuais e de adoção, em geral, e não apenas se concentrar em casamento civil igualitário e identidade de gênero, porque grande parte da diversidade sexual está localizada fora da sexualidade monogâmica institucional tradicional e convencional. O movimento internacional LGBT tem grandes conquistas, mas a política de identidade de gênero é perigosa porque certos grupos tornam-se visíveis e outros invisíveis. Não só o mercado achata diferenças, também o Estado e as adaptações de correção política, que estão enraizadas cultural, histórica e contextualmente de uma forma muito específica. A educação para a cidadania plural deve se tornar o eixo principal da educação, desde o básico até os níveis de pós-graduação. Do Instituto de Pesquisa de Comunicações (ININCO) da Universidade Central da Venezuela, a pesquisa coordenada em Gênero, Comunicação e Diversidade abordou todas as dimensões do problema.
Hugo Chavez esqueceu comunidade LGBT
Nenhum comentário:
Postar um comentário